terça-feira, 27 de setembro de 2011

Educação e Tecnologias - uma reflexão sobre direcionamentos ideológicos


 O uso das tecnologias na educação precisa estar contextualizado e de acordo com as necessidades do grupo e da instituição envolvidos. É comum em produções acadêmicas na área de informática educativa, cria a obrigatoriedade e a inserção de computadores e rede na escola com o intuito de tornar a educação mais condizente com as demandas do mundo atual. Mas, as demandas do mundo atual estão atreladas a um mundo mecanizado que se pauta na cultura do consumo, inclusive da informação!

Este posicionamento que busca introduzir todas as escolas no ciberespaço, se descontextualizado, adapta-se a uma abordagem industrial e racional da educação. Esta abordagem visa justamente que os sujeitos tenham, todos, acesso igual às tecnologias de ponta. Com isso visam sujeitos mais aptos ao mercado de trabalho.




Os paradigmas industrial e mecanicista assemelham-se ao paradigma tecnológico e são os paradigmas dominantes da nossa educação. No paradigma tecnológico, há também a preocupação com o mercado de trabalho, com os avanços científicos e para Bertrand e Valois (1994, p.108), esse paradigma “caracteriza-se por um interesse evidente pela tecnologia e por um certo esquecimento as questões educativas”. Para os mesmos autores, “o paradigma tecnológico transforma os comportamentos dos alunos com o auxílio de tecnologias e pressupõe que a eficácia e a organização racional são características importantes do funcionamento da pessoa” (1994, p.109).

É nesse sentido, que se torna pertinente humanizar o trabalho pedagógico mediado pelas tecnologias, para que não haja uma confusão metodológica e ideológica. Apesar de estarmos inseridos num paradigma que prima por ações individuais e mecanicistas, não significa que estamos condenados aos moldes da sociedade industrial. Para Bertrand e Valois (1994, p. 40), o paradigma sócio cultural existencial e humanista “recusa os valores da sociedade industrial e propõem à organização educativa, paradigmas educacionais que tenham como objetivos o crescimento e a formação afetiva das pessoas.”

Com o intuito de rever o estabelecido, e usando os instrumentos tecnológicos que mediam as relações mecanicistas, é importante buscar ludicamente perceber o mundo permeado pela mídia não para a simples aquisição de poder de manipulação de informação, mas para, especialmente, entender os mecanismos de dominação intrínsecos na sociedade midiática.

Uma estratégia é o equilíbrio entre as técnicas usadas, bem como, as modalidades artísticas, intercalando a manipulação técnica com a plástica e a visual. Outra estratégia é a busca de um ambiente harmonioso, permeado pelo diálogo e não por imposições. A afetividade pode também ser, espontaneamente, uma estratégia que permitirá que as crianças adquiram segurança – afinal, são eles quem devem manipular os instrumentos; confiança em si mesmos, porque são eles quem devem decidir como ia ser a sua produção; e o senso de grupo. Mesmo em trabalhos individuais, eles precisam saber que as suas ações influenciam o todo.
O amor, embora não seja muito citado em publicações científicas sobre educação, faz-se uma estratégica de dissolução para interesses dominantes da educação. O amor não se planeja, simplesmente acontece. Esse posicionamento está em consonância com a “Pedagogia Nova”, proveniente do movimento da Escola Nova, acontecido no Brasil em 1930, tendo originado-se nos Estados Unidos no século XIX.  Segundo Ferraz e Fusari,

[...] sua ênfase é a expressão, como um dado subjetivo e individual em todas as atividades, que passam dos aspectos intelectuais para os afetivos.  A preocupação com o método, com o aluno, seus interesses, sua espontaneidade e o processo de trabalho caracterizam uma pedagogia essencialmente experimental, fundamentada na Psicologia e na Biologia (1997, p. 31).

  
O pensamento racionalista tende a desprezar a afetividade, e a introdução dos meios tecnológicos estão ligados à rapidez, à qualidade total, à habilidade técnica desprovida de reflexões e sentimentos.  Só que o ser humano não é só racional, é também afetivo. E tende a aprender mais quando a afetividade faz-se mediadora dos processos. Por isso, o sistema educacional a menospreza. Ela não condiz com os interesses dominantes, que buscam a acomodação do sujeito em formação perante os moldes sociais. Na abordagem tecnicista e dominante, “o aluno aprende a dominar as suas emoções e seu comportamento, assim como a reprimir as suas tendências (BERTRAND e VALOIS, 1994, p.102)”.


Por isso, a arte faz-se importante dentro dos processos educativos, e deve permear os contatos com as tecnologias, com a comunicação, com a informação. A arte recria conceitos e possibilita interpretações novas da realidade e reutiliza instrumentos tornando-os neutros. Entretanto,sobre a abordagem tecnicista ainda presente nas escolas, Ferraz e Fusari dizem que:

Nas aulas de arte, os professores enfatizam um “saber construir” reduzido aos seus aspectos técnicos e ao uso de materiais diversificados (sucatas por exemplo), e um “saber exprimir-se“ espontaneístico, na maioria dos casos caracterizando poucos compromissos com o conhecimento de linguagens artísticas (1997, p. 32).

Dentro do processo artístico, além da afetividade, a imaginação, o poder de criação e a manipulação da auto-expressão, através das diversas linguagens artísticas, fazem-se práticas humanas dentro do processo pedagógico. Entretanto, segundo Duarte Júnior,
  
[...] o ato da criação é então, um ato proibido no mundo civilizado e tecnocrático. Apenas a criação de novas formas de ampliar os seus domínios é bem aceita; somente a produção que se possa converter em lucro é assimilada. Estes são limites impostos a criatividade (1981, p.101).

 Assim, faz-se preciso reverter essas tendências que também permeiam o meio artístico, a educação da arte na escola. Faz-se comum a exigência de que os professores de artes habilitem alunos para o mercado de trabalho, que o treinem para terem bom domínio técnico e ainda o instrumentalizem para a elaboração de artefatos para vendas. Longe de desmerecer outras práticas educacionais dentro do ensino das artes, faz-se urgente uma reflexão sobre qual o papel da arte, e qual seria sua atuação que se diferenciasse das demais disciplinas. Para Duarte Júnior,
  
[...] o homem utiliza a linguagem para ordenar e significar o mundo, mas ela condiciona sua percepção e seu pensamento. E ainda, construindo a cultura, o homem é por ela constituído. Tal fato ocorre também no mundo artístico: através da arte chegamos a conhecer nossos sentimentos, mas ela amolda-os (educa-os) segundo determinados padrões e códigos Simbólicos (1981, p. 106-107).
   
Por isso, a arte da cibercultura permite o contato com os sentimentos pessoais e coletivos. Faz-se diferente, pois se pauta numa outra lógica de criação e difusão. A educação para a arte, então, precisa promover, através da prática, reflexões sobre a estética e direcionamentos éticos e ideológicos no processo de produção artística.

Referências  

BERTRAND, Yves; VALOIS, Paul. Paradigmas educacionais: escola e sociedades. Lisboa: Instituto Piaget, 1994. 

DUARTE, JUNIOR, João Francisco. Fundamentos estéticos da educação. São Paulo: Cortez, 1981.
____________.  Por que arte-educação. São Paulo: Papirus, 1996.

FERRAZ, Maria Heloísa C. de T.; FUSARI, Maria Felisminda de Rezende e. Metodologia do ensino de arte. São Paulo: Cortez, 1997.
NUNES, Ana Luíza R. Trabalho, arte e educação: formação humana e prática pedagógica. Santa Maria:  Editoraufsm, 2003.


* Cartoons de nossa autoria 2006

Um comentário:

  1. oi Ro... Concordo que devemos pensar num uso da cibercultura contextualizado. Acredito que muitos dos professores tem capacidade e criatividade para adaptar o que se tem disponível para sua realidade! Beijos

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